quarta-feira, 27 de março de 2013

Perguntam

Lights in Chicago, Satoki Nagata

Perguntam o que quero
o que eu quero
e pedem-me pra explicar
identificar necessidades dificuldades
e culpados e me perguntam o que quero
Querem saber o que eu acho
saber o que sei e como vejo as coisas

As coisas, as coisas, fazem coisas
Preparam listas e organogramas
e querem saber o que eu quero
Perguntam sem olhar, perguntam!
Eu me pergunto o porquê.

Sonham com um relatório pra entender
Ignoram o cenário, a música, a luz e o olhar
Subestimam circunstâncias e perguntam
Achando que a solução estaria num roteiro
Magia que, seguida à risca, salvará
resolverá à tudo, à todos e a mim.

Acontece que o sentimento é
Ele não cabe no livro de autoajuda
Na cartilha ou na sala de aula
Não se resume numa explicação
nem mesmo em todas elas

Acontece assim, sempre foi assim
Mas perguntam mesmo assim
Ainda insistem assim
- O que você quer?

Muito infelizmente isso tudo
ainda mais pra mim
que valorizo tanto a dúvida e pergunta
por mais que exercitemos
esta será uma daquelas perguntas sem resposta.

quarta-feira, 20 de março de 2013

Simplificando

Com o passar do tempo
e o constante aparelhar-se
em que nos metemos
mais e mais, especializados
em tudo e em nada também

Quanto mais a gente sabe
neste fluxo sem fim
informações, notícias e dados
descobertas, magia, estudos
e outras inutilidades


A mente exercitada ao limite
fortalecida e nutrida com esmero
acaba por tomar proporção
desproporcional à sua importância
reduzindo assim a musculatura do espírito

Então a alma, única em nós
a ratificar-nos como humanos
atrofiada, esquecida nesta omissão
pensa no porquê é que ainda existe
se existe, o coração

E no papel em que foi colocada
a mente cada vez mais
inteligentemente burra
esquece de primeira como é
que se simplifica uma vida

quarta-feira, 13 de março de 2013

Areia de Sonho



Há muito tempo, um tempo
que o Tempo já se esqueceu
quando eu era criança
amigo íntimo da felicidade
morava numa cidade chamada Sonho

Lá havia praias de areia branca
muito branca e muito fina
a areia de Sonho
confortável areia minha

Antes de partir, talvez sabendo
o que o destino me reservava, não sei
tomei um pouco da areia branca
e fiz a ampulheta de uma vida

Ampulheta da branca areia de Sonho

Objeto pequenino a correr parado
que me socorre e me salva
a passar os grãos devagar
e me redimir a dor que não passa
e aplacar a saudade implacável

Os grãos brancos da areia de Sonho

Sonho me ensinou já na infância
a não temer nada nesse mundo
mas hoje meu único medo
é o maior medo desse mundo

Tenho medo da ampulheta se quebrar

quarta-feira, 6 de março de 2013

Querer sempre

Ás vezes eu não caibo em mim
Nem sei bem se sou eu mesmo
ou se aquilo que não cabe
é só o que sinto aqui
Eu sinto aqui fundo e forte

É o mais profundo mar
O mais impetuoso vento, ondas e velas
e portas a bater e cortinas a voar
A areia e as pás do moinho
a assobiar e zunir em mim assim


Sinto cá comigo, tanto que nem sei!
E enlouqueço explodo e implodo em mim
quieto ou não mas quieto sim
pois é o que me resta, restou
é como estou, como sou

Assim como quem não quer nada
Querer? Sempre!